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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Você meu mundo meu relógio de não marcar as horas

Você meu mundo meu relógio de não marcar horas; de esquecê-las.

Você meu andar meu ar meu comer meu descomer. 

Minha paz de espadas acesas. 

meu sono festival meu acordar entre girândolas. 

Meu banho quente morno frio quente pelando. Minha pele total. 

Minhas unhas afiadas aceradas aciduladas. 

Meu sabor veneno.

Minhas cartas marcadas que se desmarcam e voam. 

Meu suplício. Minha mansa onça pintanda pulando. 

Minha saliva minha língua passeadeira possessiva meu esfregar de barriga em barriga.
meu perder-se entre pêlos algas águas ardências. 

Meu pênis submerso. 

Túnel cova cova cova cada vez mais funda estreita mais mais. 

Meus gemidos gritos uivos guais guinchos miados ofegos ah oh ai ui nehm ahah 

minha evaporação meu suicídio gozozo glorioso.

Drummond em Amor Natural

sábado, 8 de maio de 2010

Aquilo nem era só mata, era até florestas! Montamos direito, no Olho-d'Água-das-Outras, andamos, e demos com a primeira vereda - dividindo as chapadas - : o flaflo de vento agarrado nos buritis, franzido no gradeal de duas folhas altas; e, sassafrazal - como o da alfazema, um cheiro que refresca; e aguadas que molham sempre. Vento que vem de toda parte. Dando no meu corpo, aquele ar me falou em gritos de liberdade. Mas liberdade - aposto - ainda é só alegria de um pobre caminhozinho, no dentro do ferro e grandes prisões. Tem uma verdade que se carece de aprender, do encoberto, e que ninguém não ensina:o beco para a liberdade se fazer. Sou um homem ignorante. Mas, me diga o senhor: a vida não é cousa terrível?
Lengalenga. Fomos, fomos.

João Guimarães Rosa em "Grande sertão: Veredas"

terça-feira, 18 de agosto de 2009



Deus disse: vou ajeitar você a um dom.

Vou pertencer você para uma árvore.

E pertenceu-me.
Escuto o perfume dos rios.

Sei que a voz das águias tem sotaque azul.

Sei botar cílio nos silêncios.

Para encontrar o azul eu uso pássaros.

Só não desejo cair em sensatez.
Não quero a boa razão das coisas.

Quero o feitiço das palavras.


Manoel de Barros