Arik Roper |
Quanto mais
aprofundamos, com a vida, a própria sensibilidade, mais ironicamente nos
conhecemos. Aos 20 anos eu cria no meu destino funesto; hoje conheço o meu
destino banal. Aos 20 anos aspirava aos Principados do Oriente; hoje
contentar-me-ia, sem pormenores nem perguntas, com um fim da vida tranquilo
aqui nos subúrbios, dono de uma tabacaria vagarosa.
O
pior que há para a sensibilidade é pensarmos nela, e não com ela. Enquanto me
desconheci ridículo, pude ter sonhos em grande escala. Hoje que sei quem sou,
só me restam os sonhos que delibero ter.
(...)
O ridículo é o couce da inteligência; há muito que da inteligência não possuo
senão o couce.
Se
faço estas análises de um modo lasso e casual, não é senão porque assim retrato
mais o que sou. De uma análise propriamente profunda não só sou incapaz, mas
sou também artista demais para a pensar em fazer; pensar em fazê-la seria
pensar em dar de mim a ideia de que sou uma criatura disciplinada e coerente,
quando o que sou é um analisador disperso e subtilmente desconcentrado. A minha
arte é ser eu. Eu sou muitos. Mas, com o ser muitos, sou muitos em fluidez e
imprecisão.
Fernando
Pessoa-Reflexões Pessoais (1930)
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