quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Gente



Sabe do que eu gosto?

De gente que diz que gosta de você...

Gente que vive perto

ou

gente que acaba de te conhecer.



Gosto de gente que não economiza no carinho.

Que sabe abraçar, beijar ou apertar a mão com calor.



Gosto de gente que sabe dar parabéns...

Mais do que isso...que curte dar parabéns.



Eu também gosto de gente que tem papo reto...

Que não esconde e não mente...



De gente que sabe dar colo...

Nem precisa pedir e está lá um colo companheiro.



Enfim, eu gosto é de gente!




domingo, 24 de fevereiro de 2013

Levante-se

Ricardo Beliel


Que espécie de lugar é esse que não cultiva o coração de onça

a mão de afeição

e a estúpida vontade de rasgar o império.

Pegue sua canoa e vai dar um rolé.

O mundo é bem mais complexo que a novela das seis.


Mais belo inclusive que a Patrícia Pilar. 


O Infante



Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

Fernando Pessoa, Mensagem (1934)

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Definição

Basquiat
1

Um corpo não é um fruto,
embora em tudo se assemelhem:
densa forma,
oculto gosto,
cinco letras
e um pressuposto
poder de vida.

Um corpo é mais que um fruto
que se plante,
que se colha
ou se degluta:

um corpo
é um corpo,
e um corpo
é luta.

Um corpo não é um potro,
embora assim se manifeste:
pêlos mansos,
membros ágeis,
sal na boca
e um desejo
verde pelos campos.

Um corpo é mais que um potro
que pelos prados
e currais se dome:
um corpo
é um corpo,
e um corpo
é fome.

Nem chama
que se anule,
nem espada
em duplo gume
ou máquina
de estrume.

Um corpo
é mais que tudo:
mais que a chave,
mais que a forma,
mais que o leme,
mais que o açude.

Um corpo
é mais que tudo:
é a própria imagem
que eu não pude.

2

O corpo é onde
é carne:

O corpo é onde
há carne
e o sangue
é alarme.

O corpo é onde
é chama:

O corpo é onde
há chama
e a brasa
inflama.

O corpo é onde
é luta:

O corpo é onde
há luta
e o sangue
exulta.

O corpo é onde
é cal:

O corpo é onde
é cal:

O corpo é onde
há cal
e a dor
é sal.

O corpo
é onde
e a vida
é quando.

Affonso Romano de Sant'Anna





Amores impossíveis



Amores impossíveis são mais doces ou azedos?
Amores impossíveis não amadurecem, 
são sempre aquela fruta vermelha desenhada no pé.
Suculenta, adocicada e de perpétua força curiosa.
Intocada pelos germes da ação cotidiana do “ser com”,
Não invade nem negocia.
Não desilude nem se arrepende.
Não esconde nem chora.

Amores impossíveis não germinam, 
são como a fruta egoísta sem semente.
Solitária, ameaçada e de aspecto pequeno.
Desumanizada da mão cotidiana do “ser com”,
Não atende nem afaga.
Não compartilha nem apoia.
Não revela e nem chora junto.

Amores impossíveis são mais doces ou azedos?

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Secreta



Acelera em direção ao mar.
É lá onde estão os espelhos.
As sombras do vestido.
Há ondas, eu sei.
Mas são apenas os botões que os peixes desabotoam.
Sem desejos não é possível respirar,
seja em terra firme.
Vale a pena, submergir
arrastar sereias
e voltar para casa.


O mar é uma cordilheira
vou lá todas as noites me rasgar em alguns sonhos

Quando o mar chorar
serei esse pote azul de purpurina

que costura minha fantasia.


Serei, então, da cor do mar.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

 
 
é vitalício: comer a Vida
deitando-a entontecida
sobre o linho do idioma.

Nesse leito transverso
dispo-a com um só verso.

Até chegar ao fim da voz.

Até ser um corpo sem foz.

Mia Couto

Desencontro

Arthur Pollock

 
Não ter morada
Habitar
Como um beijo
Entre os lábios
Fingir-se ausente
E suspirar
(o meu corpo
não se reconhece na espera)
percorrer com um só gesto
o teu corpo
e beber toda a ternura
para refazer
o rosto em que desapareces
o abraço em que desobedeces



Mia Couto






Viagem



O beijo da quilha
na boca da água
me vai trocando entre céu e mar,
o azul de outro azul,
enquanto
na fundo transparência
sinto a vertigem
da minha própria origem
e nem sequer já sei
que olhos são os meus
e em que água
se naufraga minha alma

Se chorasse, agora,
o mar inteiro
me entraria pelos olhos


Mia Couto

Poema Mestiço



 
Meghan Howland
 
escrevo mediterrâneo
na serena voz do Índico
sangro norte
em coração do sul
na praia do oriente
sou areia naufraga
de nenhum mundo
hei-de começar
mais tarde

por ora
sou a pegada
do passo por acontecer.
 
Mia Couto

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Comunicado

Fernando Vincinte


Na frente ocidental nada de novo.
O povo
Continua a resistir.
Sem ninguém que lhe valha,
Geme e trabalha
Até cair.

Miguel Torga