domingo, 29 de setembro de 2013

Heréticas


Fodam-se os exorcistas de plantão.
Eu gosto de pessoas com diabo no corpo.
Aquelas que rasgam seu coração.

Hippies bonzinhos com gratidão
também me enchem o saco.
Só respeito o bem assim misturadinho com o mal.

Já que é um desabafo,
Que vão para o inferno os hipócritas
Com suas cartilhas de moral e boa conduta
Meu corpo é meu
Bebo do veneno que tiver vontade
Como o cacete que achar gostoso
E semeio minhas sementes na hora que escolher.

Por fim, morte dolorida aos moderninhos
e suas mentiras escondidas com verniz.
Careta não é o abstêmio
Careta é quem faz de si um espelho.

Eu quero é andar com os loucos que não se conformam.

Podia ser um poema triste, mas é um protesto


São  abomináveis
 ações de violência contra professores.
Quando não acompanhado do reconhecimento pedagógico
 e intelectual de sua profissão,
faz-se estéril 
todo reconhecimento retórico de seu trabalho.
É estéril quando não se enlaça à valorização salarial de sua ação.

Recuso a pedagogia da violência 
pela exigência de minha humanidade
inadmito o cassetete, o gás, a bala e o camburão.

Em curso em uma cidade 
dita maravilhosa
vejo a implementação
o enraizamento 
de uma política que nos ensina:
cabe ao divergente ousado,
 ao subalterno insurgente, 
ao invisível abusado
 a repressão violenta.
O que lhe cabe é apenas o silêncio. 
Calem-se.

Com quantos silêncios permitimos isso?

segunda-feira, 23 de setembro de 2013



agradeço pelo peru selvagem e os pombos passageiros, destinados a virar merda nas saudáveis tripas americanas.

agradeço por um continente a espoliar e envenenar.

agradeço pelos índios por garantirem uma módica dose de desafio e perigo.

agradeço pelas vastas manadas de bisões para matar e depelar e depois deixar as suas carcaças à putrefação.

agradeço pelos troféus de caça de lobos e coiotes.

agradeço pelo sonho americano, por inventar lorotas até que elas brilhem à luz do dia.

agradeço pela klu klux klan. aos policiais que matam negros e os contabilizam. às decentes beatas de igreja com suas mesquinhas, interesseiras, feias e perversas caras.

agradeço pelos adesivos de “mate uma bicha em nome de jesus cristo.

agradeço pela aids de laboratório.

agradeço pela proibição e pela guerra contra as drogas.

agradeço por um país onde a ninguém é permitido cuidar da seus próprios problemas.

agradeço por uma nação de dedos-duros.

agradeço, sim, todas as lembranças – ok, deixa eu ver o que você tem nas mãos!

você foi sempre uma dor de cabeça e uma encheção de saco.

agradeço pela última e maior traição do último e maior sonho dos sonhos humanos.


William Burroughs

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Filosofia da práxis


O Mestre, o Revolucionário ou o Devoto
Varre todos os dias sua casa e seu trabalho,
Mais pela prática humilde do que pelo necessário asseio.

Para o Mestre, o Revolucionário ou o Devoto
A humanidade é sua lição cotidiana
Sua bandeira de luta
Seu guia de preces.

O Mestre, o Revolucionário ou o Devoto
Está sempre ao lado de um amigo contra a ignorância do ato
A injustiça do poder
A vilania dos corações cercados de sombra.
Tem coragem de levantar sua voz, seu corpo, sua alma.
Porque no Mestre, no Revolucionário e no Devoto
Sua mão é como sua palavra.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

O amor pelo conhecimento revoluciona


Intuitivamente
sei e conheço.
No plano do afirmar
Sou criança.
Minha suposição
É silêncio.
Foi silêncio
meu arco.
Nisso não atravessei a rua da ilusão.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Tratado geral das grandezas do ínfimo


A poesia está guardada nas palavras – é tudo que eu sei.
Meu fado é o de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.
Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado.
Sou fraco para elogios.


Manoel de Barros


terça-feira, 3 de setembro de 2013

Rumo ao Sumo




Disfarça tem gente olhando
uns olham pro alto, 
cometas, luas, galáxias. 
Outros olham de banda, 
lunetas, luares, sintaxes. 
De frente ou de lado, 
sempre tem gente olhando
olhando ou sendo olhado 
Outros olham pra baixo, 
procurando algum vestígio
do tempo que a gente acha, 
em busca do espaço perdido. 
Raros olham para dentro, 
já que não tem nada. 
Apenas um peso imenso, 
a alma, esse conto de fada. 



Paulo Leminski