quarta-feira, 15 de junho de 2011

MURILOGRAMA A C. D . A .

No meio do caminho da poesia
selva selvaggia
Território adrede
Desarrumado
Onde palavras-feras nos agridem
Encontrei Carlos Drummond de Andrade
esquipático fino
flexível
ácido
lúcido
até o osso .
Armado
De lente compasso
Gramática não-euclidiana
& humour nuclear
Na oficina-laboratório
Itabiromem claroenigmático
Extrai do léxico
Uma lição de coisas .
Enxuto abre o manúbrio
À brisa sarcástica de Minas .
Dorme acordado .

Glossógrafo declancha
Com seus olhos de termômetro
A máquina do mundo da linguagem
Em contacto contraste atrito & rotação
Diurna .

Deflagrando história & semântica
Radiografia o
Desgaste do mundo coisificado .
Destrói o córtex do verbo
Dispara o contexto insólito
Descobre a “obsolescence”
os “rifiuti”
os restos do zero .
Contrapõe às galáxias poetizadas
O inframundo
Antigaláxias da náusea
das fezes
da poeira
do mêdo
Os labirintos íntimos
A paisagem delével do sexo
A paisagem de smog
Os pontapés do amor
A insuportável dor-de-corno
A esquírola de osso do homem .

“Balançando
entre o real e o irreal”,
Investido
Do “solene
sentimento de morte”
O poeta no seu trabalho ácido
Confessando-se
confessa-nos .

E agora, Josés?
Além de Cummings & Pound
Além de Sousândrade
Além de “Noigandres”
Além de “Terceira Feira”
Além de Poesia-Praxis
Além do texto “Isso é aquilo”
Sereis teleguiados ?
Resta a ságoma de Orfeu
Com discurso ou sem .

Sôbre a página aberta
Único campo branco
Drummond fazendeiro da cidade
(Esperamos)
Lançará de nôvo
a semente .

 Roma 1965
Murilo Mendes

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